A vontade do eterno em redes efêmeras

Grata descoberta foi a deste artigo da Mirian Meliani, da PUC-SP, sobre as redes líquidas digitais. Apesar do assunto, Bauman é apenas um dos baita autores que ela usa. Curta e densa, a reflexão da Mirian traz várias questões interessantes, dentre as quais uma, em especial, me chamou a atenção.

Ela fala, via Bauman, da efemeridade como marca do tempo e das relações que se tramam por essas redes. Espaços velozes de consumo voraz. E fim. Uma espécie de deslumbramento – criação de identidade – projeção -excesso – descarte. Nessa ordem. É a obsolescência como necessidade humana.

E com isso, Mirian define sofisticada e cientificamente a orkutização:

Assim, o caráter transitório das próprias mídias sociais em estudo demonstra ser  adequado  à definição de efemeridade e à lógica do descarte, fundamentando o processo de mediação das relações interpessoais e da troca de conteúdos informacionais entre grupos. Seu modus operandi está claramente estabelecido dentro da perspectiva de atingir o número máximo de usuários. Porém, ao tornar-se popular demais, a rede injeta em si mesma um vírus letal, tornando-se também indesejada.  Ao atingir esse teto, deve ser substituída por outra, cercada por nova aura de “contemporaneidade”, “exclusividade” e “diferenciação”.

Alguma dúvida de que o Facebook e o Twitter já orkutizaram? Pela coleta de posts em formato bola de neve eu tenho chegado à deep web dessas redes. E a gente vê, talvez, seu lado “roots”:

mosaico_trivialidades

Para além do tom amo-odeio das postagens, tem um outro lado nessa história… E se o registro de tanta trivialidade for uma necessidade sobre-humana de eternizar o presente, talvez até como forma de evitar o futuro? Ao menos até quando se possa evitá-lo.

O Maffesoli fala que já não é mais preciso preocupar-se com o futuro, porque a vida lasciva, do desfrute e do gozo já acontece agora. Não precisamos mais temer o tifo ou a guerra. Mas e se… ao invés de não nos preocuparmos, tivermos medo ou simplesmente quisermos evitar o futuro? Se o temor pelo juízo final é coisa de rebanho, duas características o futuro traz como certas: o fim de um presente prazeroso e a morte.

O prazer, aqui, fica por conta da conectividade em si, do manter-se em contato, mesmo que seja para reclamar de algo ou xingar alguém. A catarse gera alívio e, nas redes, busca a resposta solidária dos amigos. A dor manifesta pelas redes é, ao fim das contas, a busca pelo prazer.

A Mirian também cita o Boaventura de Sousa Santos para falar de dilatação do presente. E me fez pensar na contradição que temos ao consumir-e-descartar as relações/informações e as próprias redes tão facilmente. Por que tão efêmero se talvez o sentido desses registros se aproxime das pinturas rupestres?

Queremos nos fazer eternos na voracidade de redes efêmeras?

***

Quem está me ajudando nessa pesquisa de análise de conteúdo, ainda em andamento, é da ferramenta de monitoramento Scup, generosa e super atentamente interessado em entender melhor o que há pelas entranhas das redes.

Leave a comment